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Deputados acionam MP para investigar se Arthur do Val violou direito internacional

Emídio de Souza e Paulo Fiorillo (PT) afirmam que há indícios de violação de convenções diplomáticas internacionais ratificadas pelo Brasil nos vídeos publicados por Arthur do Val nas redes sociais em que ele diz ter fabricado o coquetel para ser atirado em soldados russos.


Por: G1


Rodrigo Rodrigues, g1 SP


O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), deputado Emídio de Souza (PT), anunciou nesta quinta-feira (10) que vai ingressar com uma representação no Ministério Público de São Paulo para que Arthur do Val (sem partido) seja investigado por violação de tratados internacionais, ao dizer que ajudou a produzir coquetéis molotov na Ucrânia.


Na representação, Emídio pede que os promotores paulistas apurem se o parlamentar violou dispositivos diplomáticos e convenções internacionais de armas e explosivos - ratificadas pelo Brasil - ao exibir, nas redes sociais, vídeos e fotos em que narra a suposta fabricação de coquetéis molotov para serem atirados contra tropas russas na Ucrânia.


"Além da misoginia e machismo, Arthur do Val violou tratados internacionais. Vou abrir uma representação no MP contra o deputado. Fabricaçao de armas incendiárias não tem nada de missão humanitária. Isso constitui uma violação de tratados do qual o Brasil é signatário e ele precisa responder por isso", afirmou Emídio de Souza.


“Nunca imaginei que um dia nessa vida ainda faria Coquetéis Molotov para o exército Ucraniano”, disse Arthur do Val em uma foto publicada nas redes (veja abaixo).


Foto publicada por Arthur do Val nas redes sociais onde ele afirma ter fabricado artefatos explosivos na Ucrânia, para serem atirados em tropas russas. — Foto: Reprodução/Twitter

“Fizemos um monte de coquetel molotov. Para você ter uma ideia, a unidade que a gente fez, [produziu] mais de 75 mil coquetéis molotov”, declarou ele em outro vídeo postado no Instagram.


Além de Emídio, o deputado Paulo Fiorillo (PT) - presidente da Comissão de Relações Internacionais da Alesp - também disse que vai representar Arthur do Val nas autoridades competentes porque "vê indícios de violações ao direito internacional que corroboram com um pedido de investigação".


Procurado pelo g1, o gabinete do deputado Arthur do Val na Alesp afirmou, por meio de nota, que o parlamentar "não é chefe de governo, não é chefe das Forças Armadas e não é Embaixador".


"Ele foi sem passaporte diplomático, não estava em viagem oficial e não usou um centavo do dinheiro público. Ademais, as datas da viagem foram em feriado de carnaval, sendo que a Assembleia permaneceu sem sessão durante toda a semana. As acusações sugerem que um indivíduo, que não é representante do Estado, não pode se opor à posição do Itamaraty, o que demonstra uma ignorância jurídica profunda", disse a nota.


O que dizem os especialistas


Embora Arthur do Val estivesse de licença da Alesp por dois dias durante a viagem à Ucrânia, alguns especialistas em Direito Internacional afirmam que a fabricação de coquetéis molotov por parte de um parlamentar brasileiro pode configurar violação do Protocolo 3 da Convenção de 1980, sobre Armas Convencionais, da qual o Brasil é signatário.


Para o advogado criminalista Leonardo Magalhães Avelar, integrante do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), existe um dispositivo na lei brasileira que regula os armamentos no Brasil, impedindo especialmente a fabricação de armas explosivas, em que o coquetel molotov se encaixa.


O Código Penal segundo ele, fala da extraterritorialidade de crimes de um país para o outro, o que pode gerar uma eventual condenação de Arthur do Val, mesmo que a suposta infração tenha ocorrido fora do Brasil.


“A produção de coquetel molotov pode configurar crime previsto no artigo 16, inciso VI, da Lei Federal nº 10.826/03, que dispõe sobre o Sistema Nacional de Armas. Entretanto, caso cometido no exterior, o Ministério Público deve observar se os requisitos específicos de extraterritorialidade estão presentes no caso em questão, tais como: o agente deve entrar em território nacional; o fato deve ser punível também no país em que foi praticado; o crime deve estar incluído entre aqueles pelos quais a lei brasileira autoriza a extradição”, afirmou Avelar.

“A gente não sabe se de fato ele fabricou ou apenas tirou fotos desses coquetéis molotov. Cabe ao Ministério Público investigar e ouvir as partes. Mas a lei brasileira tem um dispositivo muito específico que diz que, em um caso considerado crime no Brasil e no país onde ele foi cometido, o brasileiro poderá ser investigado e punido pela Justiça brasileira”, completou.


Conselho de Ética da Alesp


Além das apurações que serão protocoladas no MP-SP, o Conselho de Ética da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) deu início nesta quarta-feira (9) à tramitação do processo contra Arthur do Val (sem partido) por quebra de decoro parlamentar, por conta dos áudios vazados com declarações sexistas sobre as mulheres ucranianas.


Nessa primeira etapa, o colegiado apenas aceitou as 21 representações contra o deputado. Elas foram transformadas em um único processo disciplinar. Outras pedidos de punição que cheguem por meio da sociedade civil, serão anexados a esse mesmo processo.

A reunião foi aberta ao público. Um grupo de mulheres e integrantes de movimentos sociais protestou contra o parlamentar e cobrou a perda do mandato dele.


Também na sessão desta quarta (9), o deputado Arthur do Val foi advertido formalmente no processo em que um assessor parlamentar dele bateu o ponto na Alesp estando fora do Brasil, em viagem ao Chile.


A aprovação da advertência no Conselho de Ética já tinha sido publicada no Diário Oficial.


Tramitação na Alesp


Arthur do Val terá o prazo de cinco dias úteis para apresentar a defesa prévia, assim que for notificado do início da tramitação do processo no Conselho de Ética nesta quarta (9).


Após a defesa prévia, na próxima semana o colegiado decide ou não se abre formalmente o processo disciplinar e escolhe um relator entre os 11 membros para definir a pena mais adequada ao parlamentar.


O deputado delegado Olim (PP) é o mais cotado para relatoria do caso e disse ao blog da Andréa Sadi que “não vai passar a mão na cabeça” de Arthur do Val.


A pena pode ir de simples advertência até a cassação definitiva do mandato. Durante essa segunda fase do processo, o parlamentar terá outro prazo de cinco sessões ordinárias da Alesp para apresentar a defesa definitiva das acusações.


Após a apresentação do parecer no Conselho, os 11 membros do colegiado votarão se aceitam ou não a punição estabelecida pelo relator.


Logo depois da aprovação pelos membros do Conselho de Ética, o processo vai para votação no plenário da Casa em forma de projeto de lei.


Para que uma punição seja aplicada em Arthur do Val, pelo menos 48 deputados (maioria simples) precisam votar favorável ao projeto.


Desfiliação


Nesta terça (8), o diretório nacional do Podemos acatou no pedido de desfiliação do deputado Arthur do Val, conhecido como Mamãe Falei, após abertura de processo disciplinar contra ele no Conselho de Ética da legenda.


Ele foi filiado ao partido por cerca de 30 dias, segundo a legenda.


“No dia da mulher (08 de março), Podemos recebe e acata desfiliação do deputado estadual Arthur do Val (SP), diante da abertura do processo disciplinar que poderia resultar em expulsão do parlamentar. Ele estava filiado ao partido há cerca de 30 dias”, declarou a direção nacional do partido.


No início da tarde, Arthur do Val também havia anunciado a saída dele do Movimento Brasil Livre (MBL), devido à grande repercussão negativa dos áudios vazados.


O deputado estadual disse também, em vídeo divulgado em suas redes sociais, acreditar que perderá seu mandato no que considera "tempo recorde".


"Vou ser cassado em três dias. Vai ser o recorde de tempo (...) Vou ser cassado em três dias porque meu áudio vazou", afirma.


O tempo, porém, não condiz com a realidade. Pelo regimento da Casa, processos de pedidos de cassação tramitam por 30 dias no Conselho de Ética, com prazos para duas defesas e, uma vez aprovada a penalidade máxima, decisão ainda precisa passar por votação no plenário.


Na gravação, ele também considera que tal punição não seja justa. "É proporcional a punição que eu estou tendo? É justo, eu mereço ser cassado? Eu acho que não."


Durante os cerca de 12 minutos da gravação, ele confirma também confira e justifica o que já havia revelado em entrevista exclusiva ao g1, que irá se afastar do Movimento Brasil Livre (MBL).


Pré-candidatura


Arthur do Val confirmou a autoria de áudios. Após o vazamento das mensagens, o deputado pediu desculpas, disse que o que falou foi um erro e abandonou a pré-candidatura ao governo do estado de São Paulo neste sábado (5).


As falas foram alvo de críticas de políticos e personalidades.


O que dizem os áudios?


Nos áudios, que circulam nas redes sociais desde a noite desta sexta (4) e teriam sido enviados para integrantes do MBL, há declarações machistas e misóginas.


“São fáceis, porque elas são pobres. E aqui minha carta do Instagram, cheia de inscritos, funciona demais. Não peguei ninguém, mas eu colei em duas ‘minas’, em dois grupos de ‘mina’. É inacreditável a facilidade. Essas 'minas' em São Paulo você dá bom dia e ela ia cuspir na sua cara e aqui são super simpáticas", diz o áudio.


As declarações teriam sido feitas durante viagem à Ucrânia. Ele disse ter viajado para enviar doações para refugiados ucranianos após a invasão da Rússia ao país.


Nos áudios, o deputado estadual também teria comparado a fila de refugiadas à fila de uma balada.


"Acabei de cruzar a fronteira a pé aqui, da Ucrânia com a Eslováquia. Eu juro, nunca na minha vida vi nada parecido em termos de ‘mina’ bonita. A fila das refugiadas, irmão. Imagina uma fila de sei lá, de 200 metros ou mais, só deusa. Sem noção, inacreditável, é um bagulho fora de série. Se pegar a fila da melhor balada do Brasil, na melhor época do ano, não chega aos pés da fila de refugiados aqui."


Em outro trecho, o áudio diz: "Passei agora quatro barreiras alfandegárias, duas casinhas pra cada país. Eu contei, são doze policiais deusas. Que você casa e faz tudo que ela quiser. Eu estou mal cara, não tenho nem palavras para expressar. Quatro dessas eram 'minas' que você se ela cagar você limpa o c* dela com a língua. Assim que essa guerra passar eu vou voltar para cá".


O que o deputado disse sobre os áudios?


Ao desembarcar no Aeroporto Internacional de Cumbica, em Guarulhos, na Grande São Paulo, na manhã deste sábado (5), o deputado estadual confirmou que são seus os áudios.


Inicialmente, ele disse que "houve um mal entendido" e que as "pessoas estão misturando os áudios com outro contexto".


"Foi errado o que eu falei, não é isso que eu penso. O que eu falei foi um erro, em um momento de empolgação", disse ele.


Depois, o deputado gravou um vídeo no qual declarou que suas frases foram "machistas" e "escrotas" e afirmou que se comportou "como um moleque" ao responder a perguntas de amigos em um grupo de conversas entre parceiros do futebol.


"Eu só quero que as pessoas me julguem pelo que eu fiz, não pelo que eu não fiz", disse o deputado.


Segundo Arthur do Val, os áudios não foram enviados a grupos "de política" e ele já estava na Eslováquia, quando teve acesso a internet, ao enviá-los.

 

Texto publicado originalmente em G1.

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