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News
Justiça Federal Afasta a Responsabilidade Penal Objetiva de Executivos Acusados de Gestão Fraudulenta
No último dia 25 de junho, a Juíza da 3ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro absolveu sumariamente 11 (onze) executivos acusados de má administração dos recursos da Fundação Rede Ferroviária de Seguridade Social (REFER), o Fundo de Pensão dos trabalhadores de várias empresas do setor ferroviário.
No caso em questão, os executivos do Fundo de Pensão foram acusados de terem realizado cerca de 12 (doze) investimentos supostamente prejudiciais aos interesses da REFER, os quais acarretaram perdas superiores a R$ 300.000.000,00 (trezentos milhões de reais) aos cofres da Entidade, supostamente por não terem sido observados os princípios da segurança, solvência, liquidez, rentabilidade e transparência exigidos pela Resolução nº 3.792/2009, do Conselho Monetário Nacional (CMN).
Nesse contexto, a decisão exarada pela Juíza Federal destacou a imprescindibilidade da descrição efetiva na denúncia acerca dos atos que consistiram na fraude em detrimento da Entidade, tendo acertadamente pontuado que o tipo penal do artigo 4º, da Lei Federal nº 7.942/86 exige que sejam narrados, especificamente, quais os negócios ou a situação jurídica que, em sua natureza, são ilegais, de tal forma que fique evidenciado na peça acusatória o dolo da fraude por parte dos administradores.
O precedente em questão é importante para reafirmar a vedação à aplicação da responsabilidade penal objetiva aos administradores de Instituições Financeiras ou equiparadas que, no pleno exercício do risco natural dos negócios de investimento, cometam eventuais atos que gerem prejuízos às Entidades, devendo ser descrito na denúncia em que consistiu a prática da fraude na gestão dos investimentos.
Jurisprudência
STJ Forma Maioria para o Trancamento de Ação Penal Por Corrupção Passiva sem a Identificação do Funcionário Público
Recentemente, por maioria dos votos, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça determinou o trancamento de ação penal contra particular pela prática de corrupção passiva, uma vez que não foi identificado nenhum funcionário público que teria praticado a conduta delitiva em concurso com o réu.
No caso concreto, o Ministério Público de São Paulo ofereceu denúncia em face do particular pela prática do crime de corrupção passiva, previsto no artigo 317, § 1º, do Código Penal, arguindo que, em concurso com fiscais de obras particulares da Secretaria de Habitação e Desenvolvimento Urbano do Município de Santo André não identificados, teria, em razão da função pública destes, solicitado vantagens indevidas em troca da expedição de Certificado de Conclusão de Obra (Habite-se).
Diante da não identificação do funcionário público, a defesa do particular impetrou Habeas Corpus requerendo o trancamento da ação penal por atipicidade, nos termos do artigo 397, inciso III, do Código de Processo Penal, uma vez que não foi demonstrado liame subjetivo entre o denunciado e o funcionário público não identificado.
De acordo com o voto vencedor do Ministro Sebastião Reis Júnior no julgamento do Agravo Regimental em Recurso de Habeas Corpus, como não há autor do delito, necessário o trancamento da ação penal contra o particular.
O entendimento firmado pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça é acertado, uma vez que no crime de corrupção passiva, o sujeito ativo é o funcionário público, podendo o particular ser denunciado apenas como partícipe ou coautor, tendo em vista a comunicabilidade das condições de caráter pessoal elementares do crime. Dessa forma, como não foi identificado o funcionário público, inviável a denúncia contra o particular pelo crime de corrupção passiva.
Legislação
Projeto de Lei nº 3673/2021 e a Proposta de Modernização do Acordo de Não Persecução Penal
O Projeto de Lei nº 3673/2021, proposto pelo Senador Wellington Fagundes do PL do Mato Grosso, busca promover mudanças relevantes no Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), estabelecido no artigo 28-A do Código de Processo Penal.
A exigência da confissão como requisito obrigatório para a celebração do acordo tem sido alvo de críticas doutrinárias, uma vez que viola o direito do réu de não produzir provas contra si mesmo e carece de valor probatório. Dessa forma, além de retirar a obrigatoriedade da confissão do investigado para a celebração do acordo, o Projeto de Lei propõe que o ANPP possa ser celebrado mesmo após o oferecimento da denúncia e antes da sentença, aplicando o princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica.
Ainda, o projeto confere a possibilidade da realização de audiências por videoconferência e o uso da estrutura do Poder Judiciário local, visando otimizar os recursos e facilitar a organização das agendas dos promotores e defensores públicos.
A dispensa da confissão como requisito obrigatório para o ANPP está em consonância com os princípios constitucionais da presunção de inocência e da não autoincriminação, previstos no artigo 5º, incisos LVII e LXIII da Constituição Federal, respectivamente. Ademais, a possibilidade de celebração do acordo em diferentes fases processuais e a utilização de recursos tecnológicos e estruturais do Poder Judiciário podem contribuir para a celeridade e eficiência na resolução dos casos.
A proposta de alteração legislativa vai ao encontro dos entendimentos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, bem como da recomendação dada pelo Procurador-Geral de Justiça do Mato Grosso, Deosdete Cruz Junior, na qual orientou que os promotores dispensem a confissão formal e circunstancial do investigado para a celebração do acordo. Essa abordagem reforça a tendência da adoção de medidas alternativas à confissão, focando na ressocialização e na garantia dos direitos dos investigados.
Assim, o Projeto de Lei nº 3673/2021 representa um passo significativo na modernização e aprimoramento do Acordo de Não Persecução Penal, buscando um equilíbrio entre a eficiência do sistema de justiça e a proteção dos direitos dos investigados, em concordância com os princípios constitucionais.
Termômetro
CNMP Edita Resolução Para Regular Participação da Vítima no Acordo de Não Persecução Penal (ANPP)
O Conselho Nacional do Ministério Público promoveu alterações na Resolução nº 181/2017, por meio da Resolução nº 289/2024, para incorporar a vítima do delito denunciado no processo de celebração de acordo de não persecução penal.
O referido acordo, previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal, e celebrado entre o Ministério Público e o investigado, é um instrumento destinado a solução consensual de uma problemática penal, o qual culmina na extinção da punibilidade do investigado. Para que produza o efeito supracitado, no entanto, exige-se como contrapartida que o investigado promova a confissão formal e circunstanciada da prática do crime e cumpra as obrigações pactuadas com o órgão acusador, dentre as quais, a de “reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo” (artigo 28-A, I, CPP).
Ocorre que, da forma como os acordos vinham sendo construídos entre o investigado e o Ministério Público, sem a participação efetiva da vítima, aflorava-se o risco da pactuação ser fixada contemplando valor muito aquém do devido pela reparação, ou mesmo de sequer haver quantia a título de reparação estabelecida.
Com a nova resolução editada pelo CNMP tais riscos foram mitigados, uma vez que regulada a participação da pessoa física ou jurídica lesada no processo de formalização do acordo, a qual “poderá prestar informações valiosas para que seja proporcionada a ela uma verdadeira reparação”, conforme exposto pelo próprio Conselheiro Relator Jaime de Cássio Miranda.
Do ponto de vista prático, a Resolução alterou dispositivos anteriores para garantir (i) direito de participação da vítima; (ii) direito de figurar como interveniente do ANPP; (iii) direito de apresentar informações e documentos; (iv) caráter de irrevogabilidade da cláusula de reparação do dano e (v) direito à reserva de um valor “mínimo do dano”.
Em nossa avaliação, a medida representa grande evolução na satisfação dos interesses do particular lesado pela prática criminosa, que poderá auxiliar na mensuração do valor do dano causado e demonstração da capacidade econômica do investigado e terá a seu favor um título executivo de natureza cível apto à execução – o que irá acelerar o processamento do ressarcimento devido nos casos de descumprimento do ANPP pelo investigado.