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Entrevista: Leonardo Magalhães Avelar

Por: Migalhas (adaptado)


Migalhas terá uma nova coluna coordenada pelo advogado criminalista Leonardo Magalhães Avelar. A coluna "Perspectivas do Direito Penal" tratará de temas relevantes e atuais de Direito Penal, com enfoque na necessária abordagem multidisciplinar com outras áreas. Em entrevista bastante pessoal, o colunista Leonardo Avelar tratou da coluna, mercado jurídico penal, carreira e até felicidade.


Migalhas: Como surgiu a ideia de criar a coluna "Perspectivas do Direito Penal"?


Leonardo Avelar: A ideia da coluna está diretamente relacionada ao histórico da minha carreira e ao recrudescimento da Justiça no campo penal.


Eu trabalhei durante 18 anos - desde a constituição do escritório - no Moraes Pitombo Advogados, uma boutique criminal visionária, que sempre se preocupou em fazer uma avaliação estratégica mais ampla que a restrita ótica criminal.


Ao atendermos empresas na esfera criminal, temos que ter em mente que as consequências jurídicas de uma infração penal permeiam inúmeras outras áreas do Direito: administrativo, regulatório, ambiental, tributário, cível, trabalhista etc.


Muitas vezes, a solução para uma questão penal - seja atuando na defesa ou na acusação - está atrelada a medidas judiciais, administrativas ou estratégicas que devem ser tomadas nas demais áreas do Direito. Por outro lado, a sensibilidade estratégica também deve ser avaliada com muita cautela na própria atuação defensiva penal. Porque uma linha que, em um primeiro momento, pode parecer interessante para a solução criminal, eventualmente, pode vir a criar uma contingência financeira insuportável para a empresa e seus acionistas.


Essa visão estratégica macro é fundamental e esse será o principal assunto discutido em nossa Coluna "Perspectivas do Direito Penal". Sempre traremos questões penais empresariais que se relacionam às outras áreas do Direito - inclusive com a participação de especialistas das mais diversas práticas.


Migalhas: E qual a relação da coluna com o recrudescimento da Justiça no campo penal?


Leonardo Avelar: Durante os últimos 18 anos eu trabalhei em praticamente todas as grandes operações ocorridas no Brasil. O que se percebe, em uma análise temporal da jurisprudência dos Tribunais Superiores, é a maior recorrência da aplicação de uma prestação jurisdicional pragmática, com violenta flexibilização dos direitos e garantias individuais.


Por exemplo, nulidades processuais que eram reconhecidas há 10 anos, em casos semelhantes atuais, não encontram mais guarida em nossos Tribunais. E, em um movimento vertical óbvio, acaba repercutindo nas decisões de primeiro grau de jurisdição.


Sem dúvida, como advogados criminalistas, devemos continuar combatendo essas ilegalidades. Ao mesmo tempo, em defesa de nossos clientes, precisamos pensar em soluções jurídicas alternativas e criativas para enfrentar os novos tempos.


Sem dúvida, diante dessas dificuldades processuais, a solução passa por uma abordagem estratégica multidisciplinar mais densa e uma produção probatória muito mais profunda e cautelosa, como já ocorre nos grandes escritórios estrangeiros. Sem improvisos, mas com criatividade.


Migalhas: Qual a razão do seu movimento de uma boutique criminal (Moraes Pitombo) para um escritório Full Service (Cascione)?


Leonardo Avelar: Depois de 18 anos, eu atingi a maioridade. Brincadeiras à parte, eu tive o melhor mentor - Antonio Sérgio Pitombo -, trabalhei com diversos advogados brilhantes e experenciei toda espécie de casos e situações na esfera penal. Todos esses fatores aliados permitiram que eu seguisse um projeto pessoal.


Migalhas: Acredita que essa migração de penalistas para escritórios Full Service é uma tendência de mercado?


Leonardo Avelar: De fato, tenho percebido um grande interesse de escritórios Full Service por criminalistas experimentados. Isso não podemos negar. Por outro lado, estou certo que as excelentes boutiques criminais continuarão tendo um espaço relevante no mercado.


Me parece que a maior diferença é a visão dos escritórios Full Service sobre a relevância da prática penal. Há alguns anos, o penal dos escritórios Full Service estava diretamente atrelado a um trabalho consultivo de apoio, compliance e investigações internas, muito distante do contencioso criminal e grandes operações.


Nesse sentido, a contratação de profissionais com larga experiência no mercado de boutiques criminais traz um indicativo de mudança de cenário no mercado.


Migalhas: Na prática, como tem sido sua experiência em escritório Full Service?


Leonardo Avelar: Considero muito boa. Creio que tive uma adaptação rápida e uma excelente receptividade do mercado, que nos identificou como: (i) uma área penal formada por criminalistas experientes, oriundos de reconhecido escritório especializado; (ii) com uma visão abrangente e multidisciplinar; (iii) dentro de uma estrutura Full Service, com sinergia entre todas as práticas e; (iv) participação efetiva dos sócios na condução dos casos.


Nós iniciamos a área penal com dois advogados no início de fevereiro. Em apenas seis meses, estamos caminhando para a sexta contratação. Não podemos reclamar.


Migalhas: Ao longo dos últimos anos, o Direito Penal despertou muito interesse. Quais conselhos você poderia dar a estudantes que pretendem seguir na área?


Leonardo Avelar: Vou fazer recomendações que funcionariam para qualquer estudante, não só de Direito. Aliás, é algo que deveria ser ensinado na escola.


A primeira observação é bastante óbvia, embora inebrie alguns crédulos: não tem milagre para o sucesso! Eu sou extremamente cético com o padrão de "gênio". Se eles existem, não me lembro de ter conhecido nenhum.


Tudo. Absolutamente tudo, em qualquer área, passa por: (i) definição do objetivo; (ii) planejamento; e (iii) execução.


Desde os singelos livros de Lewis Carroll, sabemos que: "se você não sabe onde quer chegar, qualquer caminho serve". Partindo do pressuposto que você gosta do que faz, a definição do seu objetivo vai ser sua motivação diária, e estará intimamente ligado à efetividade da execução do seu plano.


Tenho muitos amigos empresários e aprendo bastante com eles sobre liderança, gestão e planejamento. São características essenciais para um profissional, infelizmente, bem pouco difundidas entre os advogados, que acabam se preocupando mais com a parte acadêmica e técnica.


Migalhas: O que seria um bom líder jurídico?


Leonardo Avelar: Não diria "líder jurídico". Líderes são líderes e possuem características semelhantes, independente da área de atuação.


Ao contrário do que muitos imaginam, liderar é servir. O tempo todo. Devemos preparar os profissionais para que eles estejam prontos para partir e cuidar deles para que queiram ficar. Se eu perder um profissional, a culpa jamais será dessa determinada pessoa, ou do mercado. A responsabilidade será sempre minha.


Particularmente, a minha equipe é sensacional. São técnicos, inteligentes e motivados.


No trabalho, além da avaliação estratégica, desenvolvimento da atividade jurídica e identificação do pano de fundo das questões, as minhas funções como sócio da área também estão atreladas ao reconhecimento e extração das habilidades de cada membro da equipe e ser um facilitador do trabalho de todos.


O mundo mudou. O mercado mudou. As gerações são diferentes, possuem prioridades distintas e objetivos novos. Temos que saber ler isso e definir o que fazer com essa informação. Os novos profissionais não buscam um trabalho, eles querem uma carreira. Não querem ser cumpridores de funções, desejam estar engajados em um propósito, com sensação de pertencimento à instituição.


The Golden Circle, desenvolvido por Simon Sinek, explica bastante sobre propósito. No seu livro Start With Why, explica a razão pela qual os líderes e companhias que se comunicam de dentro para fora (Why / How / What) causam um impacto muito maior no mercado, o que explica o sucesso de empresas como Apple e Facebook.


Ao serem questionadas sobre o "porquê" fazem sua atividade profissional, muitas pessoas respondem "dinheiro". Na minha opinião, a questão financeira é importante, mas não pode ser a mais relevante. Na verdade, deve ser considerada uma consequência natural do bom trabalho realizado.


Nosso escritório está iniciando um trabalho incrível de mentoria, em que os sócios voluntários serão mentores dos advogados mais jovens das outras áreas. Cabelos brancos importam e experiências devem ser compartilhadas.


Migalhas: É reconhecido que muitas pessoas no mercado jurídico são infelizes ou sofrem de burnout, em razão do trabalho excessivo. Qual sua impressão sobre isso?


Leonardo Avelar: Vejo advogados se vangloriando de trabalhar 14h-16h por dia. Sinceramente, isso não me impressiona.


Salvo raras exceções sazonais com explicação pontual, trabalhar durante 14h-16h por dia pode ser um indicativo de três fatores: (i) há um dimensionamento errado na proporção trabalho / equipe, o que deve ser corrigido com urgência, sob pena de perder profissionais e diminuir a qualidade do trabalho; (ii) há uma disfunção na divisão do trabalho entre os integrantes da equipe, que costumeiramente ocorre pelo desequilíbrio na expertise dos profissionais. Curiosamente, isso costuma apenar os profissionais mais competentes, que acabam recebendo mais trabalho por performar melhor. Isso pode criar uma nefasta sensação de injustiça no ambiente de trabalho; (iii) inoperância e falta de produtividade do profissional.


Cada vez mais as empresas se preocupam com o bem-estar e a felicidade de seus colaboradores. Temos que ter autocrítica para identificar que isso ainda está engatinhando no mercado jurídico brasileiro.


É necessário visualizar que o bem-estar dos colaboradores tem relação direta com o sucesso da instituição. São inúmeros os estudos que comprovam que profissionais felizes possuem maior produtividade.


Particularmente, considero que a felicidade é poder viver bem, de acordo com os seus valores e pilares. Dentro do meu microcosmo profissional, procuro entender os valores da minha equipe e me importar genuinamente com a satisfação de todos: "Kindness is such a signature of the Strong".


Migalhas: Já que entramos nessa esfera tão pessoal, o que é felicidade para você?


Leonardo Avelar: Identificar e encontrar o equilíbrio entre aquilo que te faz feliz e o que você considera relevante. No meu caso, procuro dividir meu tempo entre minha família, esposa, três filhos, trabalho, amigos e hobbies.


Migalhas: E cabe tudo isso na vida de um criminalista?


Leonardo Avelar: Eu fiz esporte competitivo (Triathlon) durante 20 anos. Certa vez, um treinador disse que eu tinha um único "talento". O "talento" para ter disciplina. Achei genial e realmente carrego isso há muito tempo. Ao contrário do que muitos pensam, ser organizado e ter disciplina não é uma prisão. É o primeiro caminho para ter liberdade.


Sem falsa retórica, eu amo o que eu faço e desenvolvo a minha própria rotina de uma forma que faz sentido para mim. Desta forma, eu consigo segui-la de forma consistente. Consistência é o nome do jogo. Não adianta se dedicar 1 dia, 1 semana ou 1 mês. Você tem que se dedicar o tempo todo.


Em um treinamento do meu amigo, Bruno Strunz, discutimos a necessidade de criar uma linha amarela imaginária. Em outras palavras, nada mais é que estar 100% envolvido com a atividade que você está realizando naquele momento. Se eu estou me preparando para um julgamento, nada vai me distrair e vou analisar cada detalhe do caso; se estou em uma reunião com um cliente, estou em escuta ativa durante toda a reunião; quando estou em casa com minha esposa e meus filhos, estou 100% com eles. Tão simples quanto isso! Easy Words, Difficult Efforts.


Particularmente, eu acordo 5h da manhã há mais de vinte anos. Às 8h, eu já meditei, fiz meus esportes, li dois jornais e estou tomando café da manhã com meus filhos. Isso é muito pessoal e funciona bem para mim, mas pode ser terrível para outra pessoa. O que importa é ter sensibilidade para entender as vicissitudes da vida e idiossincrasias de cada um; e respeitar isso.


Confira o vídeo:



 

*Leonardo Magalhães Avelar. Advogado Criminalista. Membro do Observatório do Direito Penal. Advogado do Escritório Avelar Advogados.

 

Texto publicado originalmente em Migalhas.

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