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Tribunal de Justiça de São Paulo Determina Instalação de CPI para Apurar Irregularidades na DERSA
O Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, em Mandado de Segurança impetrado por uma Deputada Estadual, anulou ato da Presidência da Assembleia Legislativa de São Paulo (ALESP) que havia cancelado a instauração de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar supostas irregularidades praticadas no âmbito da DERSA, empresa de economia mista responsável por construir, operar, manter e administrar rodovias e terminais intermodais no Estado de São Paulo.
Isso porque, de acordo com o Presidente da ALESP, os fatos que seriam apurados possuiriam "contornos imprecisos e excessivamente genéricos". Em análise ao mérito do Writ, o Desembargador Relator Fábio Gouvêa determinou que a ALESP adote as providências para a instalação da CPI, tendo em vista que (i) o pedido de instalação da CPI demonstra, de forma suficiente, o fato a ser investigado, estando lastreado em apurações pretéritas e matérias jornalísticas; e (ii) há interesse público na apuração de investigações envolvendo fraudes em licitações de grandes obras.
A CPI está prevista no artigo 58, §3º, da Constituição Federal e artigo 13, §2º da Constituição Estadual de São Paulo, e constitui investigação conduzida pelo Poder Legislativo (i) criada mediante requerimento de um terço de seus membros; e (ii) destinada a apuração de fato determinado em prazo certo. Por sua natureza, os parlamentares que nela atuam podem determinar diligências, ouvir investigados e testemunhas e requerer a quebra de sigilo bancário, fiscal e telefônico. Ainda, como não tem competência para punir os responsáveis que venham a ser identificados no curso das investigações, a CPI elabora, ao final dos trabalhos, um relatório final contendo apontamentos e os encaminha aos órgãos competentes, para que promovam a responsabilidade civil ou criminal dos envolvidos.
Nesse sentido, importante destacar que a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo está em consonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que admite a impetração de Mandado de Segurança por parlamentares que tenham subscrito requerimento de instalação de CPI, para assegurar o direito a instauração do inquérito, quando, ainda que preenchidos os requisitos do artigo 58, §3º, da Constituição Federal, a CPI não é instalada. Embora a matéria seja constitucional e passível de controle jurisdicional, é importante que o Poder Judiciário tenha cautela em decisões como esta, a fim de evitar indevida interferência nas determinações do Poder Legislativo, em violação ao princípio constitucional da separação e independência entre os poderes.
Jurisprudência
Crime Ambiental: STJ Decide pela Extinção da Punibilidade de Pessoa Jurídica em Caso de Incorporação
Julgado: REsp 1.977.172
A 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao analisar Recurso Especial interposto pelo Ministério Público em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, negou provimento ao pleito, assentando o entendimento de que há extinção da punibilidade de uma pessoa jurídica ao ser incorporada por outra pessoa jurídica.
O tema controverso dividiu os Ministros da Corte, prevalecendo o entendimento do Relator, Ministro Ribeiro Dantas, por 5 votos a 4. Desse modo, restou superada a tese de que a incorporação de uma sociedade por outra seria apenas um manejo econômico a viabilizar a continuidade das atividades, o que não implicaria na extinção de sua punibilidade – divergência aberta pelo Ministro Joel Ilan Paciornik – e prevaleceu a posição que reconhece a aplicabilidade das hipóteses do artigo 107, do Código Penal, às pessoas jurídicas, com a equiparação, no caso, da morte da pessoa física à extinção da pessoa jurídica para fins de punibilidade.
Assim, considerando-se que a personalidade jurídica é adquirida quando a sociedade passa a ter inscrição de seus atos constitutivos perante os órgãos competentes, momento este que pode ser considerado seu “nascimento” (artigo 985 do Código Civil), a “morte” da pessoa jurídica se dará com o cancelamento de sua inscrição no Cadastro Nacional e a consequente perda de personalidade, o que ocorrerá nas hipóteses descritas nos artigos 227 a 229 da Lei nº 6.404/76 e 1.116 a 1.122 do Código Civil – a incorporação, a fusão ou a cisão das sociedades – , momentos nos quais ocorrerá a extinção da personalidade jurídica, a ser equiparada, para efeitos legais, à morte da pessoa natural.
A posição vencedora é acertada e consagra o princípio constitucional da intrancendência das penas (artigo 5º, XLV), o qual também deve ser aplicado às pessoas jurídicas. Nesse sentido, a responsabilidade penal, assim como ocorre em relação às pessoas físicas, deve ser restrita, àquela pessoa jurídica que efetivamente praticou a conduta ou concorreu para sua prática, sob pena de se violar a estrita legalidade e a vedação à transferência de penas e de responsabilidade penal.
Legislação
Projeto de Lei Permite Habeas Corpus para Empresas
Está em trâmite na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 904/2022, apresentado pela Deputada Bia Kics (PL-DF), que visa permitir Habeas Corpus para proteger pessoas jurídicas contra atos abusivos ou ilegais. Assim, passaria a ser considerada coação ilegal situações em que empresas fossem submetidas à busca e apreensão, bloqueios cautelares de bens, valores, ou qualquer outro meio, sem a devida fundamentação.
A deputada autora do projeto argumenta que a proposta tem como objetivo assegurar os direitos de pessoas jurídicas, já que “não há amparo legal que as resguarde e proteja de eventuais ilegalidades ou abusos de poder originados em ação penal em que elas sejam parte’’.
Diferentemente do alegado pela Deputada, no atual sistema jurídico, eventuais ilegalidades ou abusos de poder em face de pessoas jurídicas podem ser discutidos por meio de Mandado de Segurança (artigo 5º, LXIX, CF), ação constitucional que tem por objetivo a proteção de direito líquido e certo, que não estejam amparados pelo Habeas Corpus – o qual protege a liberdade de locomoção – ou pelo Habeas Data – que protege o livre acesso a registro de dados pessoais. A utilização do Mandado de Segurança para resguardar pessoas jurídicas de eventuais ilegalidades é, inclusive, amplamente aceita na jurisprudência.
Nesse sentido, importante destacar que o Habeas Corpus possui como objetivo primordial a proteção à liberdade de locomoção, de ir, vir e ficar de pessoas físicas, de modo que a sua extensão para pessoas jurídicas constitui verdadeiro desvirtuamento do instituto.
Ao que tudo indica, a proposta está relacionada a uma resposta imediata por parte dos apoiadores do Presidente da República, à Operação realizada pela Polícia Federal, envolvendo empresários que teriam defendido um golpe de Estado no país, que, dentre outras medidas, resultou em buscas e apreensões e afastamento de sigilo bancário de pessoas físicas e de empresas. Não obstante as medidas deferidas pelo Ministro Alexandre de Moraes na referida Operação sejam discutíveis, não é possível admitir projeto de Lei atécnico, de modo que se espera que a proposta seja rejeitada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.
Avelar Advogados na Mídia
Leonardo Magalhães Avelar comenta o arquivamento de inquérito envolvendo a Cohab de Bauru - SP. Leia a matéria publicada em ConJur.
Termômetro da Semana
Considerações Sobre o Instituto do Foro Privilegiado no Brasil e no Mundo
No último mês de agosto, o Supremo Tribunal Federal julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7732 ajuizada pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (ADEPOL), e reconheceu a constitucionalidade da exigência prevista na legislação de Goiás, que condiciona o desenvolvimento de investigações criminais em face de autoridades detentoras de foro privilegiado por prerrogativa de função à prévia autorização do Tribunal de Justiça daquele Estado, da mesma forma com que o Supremo Tribunal Federal realiza a supervisão judicial de atos investigatórios em face de autoridades com prerrogativas no STF.
Nesse sentido, cumpre esclarecer que o instituto do foro privilegiado consiste no direito conferido a algumas autoridades públicas de não serem julgadas em primeira instância nos procedimentos que versem sobre crimes praticados em razão da função, e durante o exercício do cargo, nos termos dos artigos 53 e 102, ambos da Constituição Federal, e da interpretação do Supremo Tribunal Federal acerca dessa matéria.
Como efeito prático, elogia-se que o instituto objetive preservar o julgador de sofrer influência ou pressão política ao julgar uma autoridade pública e, por consequência, de emitir decisões eivadas de arbitrariedade. Por outro lado, a autoridade pública detentora de foro privilegiado por prerrogativa de função possui limitação ao seu direito recursal, em especial nos casos em que o julgamento ocorre no próprio Supremo Tribunal Federal.
No cenário nacional, o levantamento realizado pela Consultoria Legislativa do Senado estimou que cerca de 55 (cinquenta e cinco) mil pessoas possuem foro privilegiado no Brasil, dentre os quais: Presidente, Vice-Presidente, Governadores, Prefeitos, Senadores e Deputados Federais. O instituto também está consagrado em diversas legislações ao redor do mundo, embora estudos comparativos demonstrem que o caso brasileiro é reconhecido por prever rol consideravelmente extenso de hipóteses sujeitas ao foro privilegiado em relação aos demais países.
À título exemplificativo, em Portugal, os parlamentares do país não gozam desse instituto, que se restringe aos cargos do Presidente, Primeiro-Ministro e Presidente da Assembleia da República, os quais são julgados pelo Supremo Tribunal nos crimes eventualmente praticados no exercício do mandato. Já na Suécia, o rei possui imunidade absoluta, mas em contrapartida as demais autoridades públicas não são passíveis desse direito. Por sua vez, o modelo francês vem sofrendo alterações desde a década de 1990, quando o país foi surpreendido por eventos midiáticos de corrupção, que resultaram em mudanças na legislação e na própria Constituição francesa, no sentido de facilitar a responsabilização das autoridades públicas por eventuais crimes cometidos.
Na atualidade do caso brasileiro, o STF vem conferindo interpretação mais restritiva às hipóteses de foro privilegiado por prerrogativa de função, estreitando o instituto conferido aos Deputados Federais e Senadores, apenas para os crimes cometidos durante o exercício do cargo, desde que relacionados às funções desempenhadas (QO na AP 937/RJ). Na mesma ocasião, reconheceu-se que o Deputado Federal ou Senador que deixar o mandato antes da intimação para apresentar alegações finais perderá a distinção de julgamento, independente do motivo da perda do cargo. Todavia, a prerrogativa será mantida no caso de “mandato cruzado”, quando o investigado for eleito para outra Casa Legislativa durante a tramitação do inquérito ou da ação penal (QO no INQ 4342).
Logo após a decisão do Supremo, o Presidente da Câmara dos Deputados requisitou a instauração de comissão para discutir a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 333/2017, cujo objetivo é a extinção do foro especial para os crimes comuns, à exceção de apenas cinco autoridades - Presidente da República, o Vice-Presidente, o Presidente da Câmara dos deputados, o Presidente do Senado, e o Presidente do Supremo Tribunal Federal. Até o momento, a PEC apresentada há mais de cinco anos aguarda a aprovação do plenário.
Seguindo a harmonia de outros países, e diante do movimento legislativo, que conta com o aparente apoio do Poder Judiciário, a tendência para os próximos anos é de que o instituto do foro privilegiado perca força significativa, ou, ao menos seja restringido o rol de autoridades públicas que fazem jus ao benefício, principalmente em razão das inúmeras críticas diretas ao instituto levadas à cabo no período lavajatista.
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