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STJ Anula Decisão que Deferiu Busca e Apreensão Por Ausência de Fundamentação Idônea
Aos 11 de outubro de 2022, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu ordem de habeas corpus para tornar sem efeito decisão que deferiu medida de busca e apreensão em face da esposa do ex-Prefeito de Manaus/AM, em razão de sua fundamentação genérica e inidônea, bem como da motivação do ato judicial ser fundada em petição de princípio.
Isso porque, conforme levantado pela defesa da impetrante e destacado no voto do Relator, Ministro Rogério Schietti, o Juízo de 1º grau não demonstrou a existência de indícios de autoria, nem a indispensabilidade da medida, tendo a decisão caráter genérico e sendo ausente de elementos concretos, limitando-se a afirmar que o fumus comissi delicti e a imprescindibilidade da medida emergiriam da documentação acostada ao procedimento investigatório, argumento inidôneo que poderia ser aplicado a qualquer caso.
Ademais, o Ministro Relator destacou o uso de petição de princípio na argumentação manejada pelo Juízo ao afirmar que “os agentes ministeriais demonstraram a necessidade da decretação da busca domiciliar, pois formalmente, sem a autorização judicial, estaria impedida de entrar na residência dos representados em virtude da proteção constitucional e, materialmente, sem a referida decisão, não conseguirá obter indícios relacionados à conduta criminosa, notadamente a arma utilizada na empreitada delitiva”.
Ao usar como premissa para sua decisão uma conclusão que só seria alcançada se essa premissa fosse verdadeira, o Juízo dá como provado aquilo que precisa demonstrar na sua fundamentação, como se já tivesse certeza de que há conduta criminosa e a decisão judicial fosse mero instrumento para se provar a prática de tal conduta, o que não se pode admitir, vez que a razão de ser necessária a prolação de decisão judicial autorizadora de busca e apreensão é justamente a proteção dos direitos fundamentais.
Diante disso, evidente que a decisão que deferiu a medida cautelar viola o princípio da motivação expressa das decisões judiciais contido no artigo 93, IX, da Constituição Federal. Assim, de forma acertada, a Sexta Turma identificou a manifesta ilegalidade e tornou sem efeito a decisão de primeira instância, consagrando a preservação dos direitos fundamentais, os quais não podem ser flexibilizados em desacordo com os parâmetros constitucionais e legais do ordenamento jurídico brasileiro.
Jurisprudência
STJ Absolve Administrador Condenado Por Deixar de Recolher ICMS em Meses Aleatórios
Denunciado pelo Ministério Público Estadual de Santa Catarina, o administrador de uma empresa fabricante de máquinas foi condenado à pena de um ano e dois meses de reclusão por ter deixado de recolher ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) em meses não consecutivos durante os anos de 2012 e 2013.
Após o trânsito em julgado da condenação, a defesa do administrador impetrou habeas corpus para requerer a sua absolvição, tendo em vista a ausência de dolo específico na apropriação dos valores devidos ao Fisco e o fato de o administrador não ser devedor contumaz.
Durante o julgamento, ocorrido no último dia 11 de outubro, o Ministro Sebastião Reis Júnior relembrou que o Supremo Tribunal Federal já havia se pronunciado sobre o tema em outro julgamento, decidindo que o crime em questão só ocorre se o autor, de forma contumaz (insistência no desrespeito à Lei) e com dolo de apropriação (vontade de se apropriar dos valores retidos), deixa de recolher ICMS cobrado do adquirente da mercadoria.
Assim, acertou a Sexta Turma do STJ ao absolver o administrador da empresa, já que no caso concreto não ficou demonstrada contumácia ou dolo, tendo em vista que a falta de recolhimento do tributo ocorreu em meses não consecutivos e que não se evidenciou a específica intenção do administrador em se apropriar do valor que deveria ser pago a título de ICMS.
A decisão do Superior Tribunal de Justiça está em consonância com a manifestação do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento do RHC n.º 163.334, oportunidade em que o Ministro afirmou que a criminalização da dívida de ICMS declarado deve ser usada com cautela, pois deve servir para perseguir o devedor fraudulento, que vive às custas do erário, e não inviabilizar a atividade empresarial.
Legislação
No Cenário Pós-Eleição, Votação do Projeto de Lei que institui o novo Código de Processo Penal Deverá Ser Concluída Até Dezembro
Em debate na Câmara dos Deputados desde 2010, o novo Código de Processo Penal teve suas discussões retomadas após a criação de um grupo de trabalho montado pelo presidente da Câmara dos Deputados em 2021 e que teve seus trabalhos retomados em abril de 2022. O texto foi elaborado por uma comissão de juristas reunidos pelo Senado Federal e deve ter a análise de seu esboço finalizada pelo Grupo ainda este ano.
Caso a proposta venha a ser aprovada sem novas adições ou subtrações, o Código de Processo Penal, que mantém, em geral, a redação de quando foi instituído em 1942, ainda no Estado-Novo, sofrerá centenas de mudanças na forma como se dão a condução de investigações e os julgamentos de ações penais, incluindo a regulamentação da investigação criminal pelo Ministério Público, regras sobre Cooperação Jurídica Internacional, utilização de provas digitais, unificação de quase todos os prazos processuais em quinze dias corridos, pacificação das competências das polícias civil e militar e inclusão de um capítulo sobre justiça restaurativa, com ferramentas voltadas à auxiliar a vítima a superar o trauma que sofreu.
Dentre as alterações positivas, destacam-se a criação do instituto da investigação defensiva — que autoriza o investigado e seu advogado a produzir provas —, regras mais rígidas sobre o cumprimento de mandados de busca e apreensão, o uso da força policial e de algemas, e a fixação de prazo para que o Judiciário implemente o juiz de garantias, de modo que o Juízo que instrui a investigação criminal não seja o mesmo que atuará na ação penal dela decorrente.
Dentre os pontos mais polêmicos, destaca-se a possibilidade de que a prisão seja autorizada após a decisão condenatória em segunda instância ou colegiada, o que viola o disposto no artigo 5º, LVII, da Constituição Federal, que determina que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”, o qual, por ser cláusula pétrea, não admite interpretação divergente a que o constituinte atribuiu ao texto constitucional para assegurar a proibição antecipada da pena.
O Projeto de Lei, já submetido a diversas comissões, encontra-se na fase final de votação pelo grupo de trabalho, o qual sofrerá relevante perda de seus membros no próximo ano devido à não reeleição de deputados centrais ao debate. No cenário pós-eleição, o presidente da Câmara dos Deputados reuniu lideranças partidárias para que o texto do novo CPP seja votado até dezembro, a fim de que não seja necessário reiniciar o debate pela quarta vez em 2023.
O cenário atual, somado ao empenho do presidente da Câmara, renova a expectativa de que a votação em Plenário ocorra até o fim do ano, de modo que se espera que os parlamentares tenham o senso crítico necessário para melhorar o texto da Lei, a fim de tornar um processo penal mais célere e efetivo, sem, contudo, inovar em retrocessos que violem direitos e garantias fundamentais do investigado.
Avelar Advogados na Mídia
Leonardo Magalhães Avelar comenta perda de foro privilegiado do presidente Jair Bolsonaro em publicação do Estadão. Leia a matéria completa.
Leonardo Magalhães Avelar avalia prática de crimes contra Estado Democrático de Direito em publicação do Estadão. Leia a matéria completa.
Em entrevista ao Jornal da Record News, Beatriz Esteves comenta pedido negado para a extradição do jogador Robinho. Confira a entrevista.
Em publicação de O Globo, Leonardo Magalhães Avelar comenta alusões a práticas nazistas em manifestações. Leia a matéria completa.
Em publicação do ConJur, Leonardo Magalhães Avelar comenta decisão em que Avelar Advogados atuou para reverter condenação em crime tributário. Leia a matéria completa.
Leonardo Magalhães Avelar e Paula Degenszajn Stolar comentam as repercussões criminais na utilização de drones, em artigo para o Estadão. Leia a publicação completa.
Termômetro da Semana
STF Decide que a Defesa Deve Ter Acesso às Tratativas de Negociação e Homologação do Acordo de Colaboração Premiada Utilizado Para Embasar Denúncia
O instituto da colaboração premiada foi introduzido em nosso ordenamento jurídico pela Lei de Organizações Criminosas, e reflete uma tendência mundial consistente na adoção do modelo negocial na seara penal, servindo como meio de obtenção de provas para combate de determinados crimes, em especial aqueles que são articulados por meio de estruturas sofisticadas de difícil investigação, conforme se verificou no “Mensalão” e na Operação Lava Jato.
Nesse contexto, em outubro deste ano, o Supremo Tribunal Federal debruçou-se sobre relevante questão concernente ao instituto, ao julgar a Reclamação Constitucional nº 56.115. Nesta Reclamação, apresentada pelos réus denunciados por corrupção ativa e lavagem de dinheiro no contexto da operação Lava Jato, a Defesa requereu a disponibilização das gravações audiovisuais e atas de todas as reuniões e tratativas do acordo de colaboração premiada do qual a denúncia é derivada.
Isto porque, conforme alega os denunciados, o não fornecimento de tais gravações e documentos viola a Sumula Vinculante 14, do Supremo Tribunal Federal, a qual determina que "é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa".
No julgamento, a Corte Suprema estabeleceu que o pleno exercício do direito de defesa exige que o acusado tenha acesso às negociações e à audiência de homologação do acordo de colaboração premiada que o incrimine, de modo que ficou assegurado aos denunciados o acesso a documentos da colaboração em que se baseou a Denúncia.
O Relator, Ministro Ricardo Lewandowski, ressaltou que tal entendimento já havia sido firmado em outros julgados da Corte e ‘’tem por objetivo viabilizar aos acusados o exercício do contraditório para repelir, se for o caso, tudo aquilo que venha a ser usado contra ele pela acusação, evitando abusos e a ocultação de elementos de prova, de modo a fazer valer o direito constitucional ao devido processo legal e à ampla defesa’’. Desse modo, a disponibilização dos documentos apenas deve ser negada quando houver a concreta possibilidade de prejudicar as investigações, o que não se verificou no caso concreto.
Não se desconhece que o refinamento da criminalidade organizada exige a adoção de outros meios de obtenção de provas para impulsionar a persecução penal, como o instituto da colaboração premiada. Contudo, apesar da importância da justiça negocial, não se pode renunciar aos princípios basilares do Processo Penal, apenas com o intuito de punir.
Desse modo, o acesso, pela Defesa, às tratativas de negociação e homologação da colaboração garante ao acusado a concretização dos princípios da ampla defesa e paridade de armas, essenciais para a efetivação de um Processo Penal Democrático.