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ODP News | 07.03.2023 | Edição n. 47

Notícias, Jurisprudências, Projetos de Lei e o Termômetro da Semana

News

STF Decide que Autoridades Nacionais Podem Requisitar Diretamente Dados de Empresas de Tecnologia com Sede no Exterior

O Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade (i) do Decreto n.º 3.810/2001, que promulgou o Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal (MLAT) celebrado entre o governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América e (ii) dos artigos 237, inciso II, do Código de Processo Civil e 780 e 783 do Código de Processo Penal, que tratam do procedimento para expedição de carta rogatória.

Não obstante o reconhecimento da constitucionalidade dos dispositivos, o STF entendeu que as autoridades nacionais podem solicitar diretamente dados aos provedores de internet estrangeiros nos casos de (i) atividades de coleta e tratamento de dados no país; (ii) posse ou controle de dados por empresa com representação no Brasil e (ii) crimes cometidos por indivíduos localizados em território nacional.

O entendimento ocorreu no âmbito da Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 51, proposta pela Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional), que buscava o reconhecimento da constitucionalidade e correta aplicação do procedimento MLAT, com requisição dos dados à pessoa jurídica que os detém e não à filial sediada no Brasil. Isso porque, os Tribunais brasileiros, com base em argumentos utilitaristas de celeridade dos atos processuais, deixavam de utilizar o MLAT – alegando que o procedimento iria demorar muito tempo – e aplicavam multas pecuniárias e até responsabilização criminal de funcionários em casos de não fornecimento de conteúdo de mensagens de forma direta.

Ao que tudo indica, o resultado do julgamento - que teve início em setembro de 2022 e estava suspenso com pedido de vista do Ministro Alexandre de Moraes - sofreu grande influência dos atos golpistas do dia 08 de janeiro de 2023 e da proliferação das fake news, que circularam em provedores de aplicação de internet. Nesse sentido, o Ministro relembrou que os atos antidemocráticos em Brasília foram combinados via Telegram, empresa que possui sede em Dubai.

Não obstante a necessidade do aumento na eficiência e celeridade na obtenção de dados em investigações criminais, ao que parece, ainda existe uma falta de compreensão do Poder Judiciário a respeito do funcionamento e da guarda de dados por meio das empresas de tecnologia situadas em outros países.

A discussão envolve Direito Internacional e deve estar em harmonia com as legislações dos países sedes das empresas e com os acordos bilaterais para a obtenção de dados e de comunicações eletrônicas, de modo que se espera que o Poder Legislativo e o Poder Executivo aperfeiçoem o estudo sobre a matéria no projeto da Lei Geral de Proteção de Dados para Fins Penais (LGPD Penal) e em novos acordos de cooperação internacional entre países.

 

Jurisprudências

Denúncia Oferecida Contra Empresário Acusado Por Crime Tributário é Anulada Por Violação ao Princípio do Promotor Natural

Em caso que contou com a atuação do escritório Avelar Advogados, a Juíza da 2ª Vara Criminal de Goiânia declarou a nulidade da denúncia e de todos os demais atos processuais praticados pelo Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de Goiás (CIRA-GO) em ação penal movida contra empresário que, supostamente, teria deixado de recolher o tributo ICMS nos períodos de maio a de dezembro de 2016, janeiro de 2017, e janeiro a dezembro de 2018.


O entendimento fixado fundamentou-se no argumento da defesa realizada pelo nosso escritório, que alegou violação ao princípio constitucional do promotor natural, pois o Cira não poderia atuar no caso, o que foi acolhido pelo Ministério Público.


Na decisão, a Magistrada destacou que o CIRA-GO é órgão colegiado vinculado ao Poder Executivo e destinado à recuperação de ativos do Estado de Goiás, sendo sua participação de viés meramente cooperativa, voltada à garantia do suporte necessário ao Promotor de Justiça com atribuição para atuar nos crimes contra a ordem tributária - conforme menciona o artigo 9º da Lei que instituiu o órgão (Lei Estadual nº 19.878/2017), a atuação do grupo será feita sob modelos de força tarefa, com a participação de todos os órgãos do grupo operacional: Promotor de Justiça; Procurador do Estado; Delegado de Polícia; Agentes de Polícia; Escrivão de Polícia e Auditores-Fiscais.


O acertado entendimento conferido pela 2ª Vara Criminal especializada de Goiânia está alinhado com o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, que resguarda o princípio constitucional do promotor natural como medida para garantir a segurança jurídica e coibir abusos em investigações criminais conduzidas por órgãos acusatórios sem atribuição.


Por fim, importante ressaltar que estão pautadas para julgamento no mês de março três ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 2.943, 3.309 e 3.318) no Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Ministro Edson Fachin, que discutem a possibilidade de o Ministério Público assumir a função de Polícia Judiciária para realizar investigação direta de infrações penais, de modo que se espera que a Corte Suprema trate o tema com cautela, tendo em vista os inúmeros casos de investigações controversas conduzidas por membros do Ministério Público, sem nenhum tipo de controle jurisdicional, em violação às garantias processuais do investigado.

 
STJ Veda a Aplicação Irrestrita da Argumentação Per Relationem

Em recente decisão monocrática, o Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao Agravo em Recurso Especial nº 2.275.480/SP, para determinar a devolução do processo ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, a fim de que os Desembargadores reanalisem o acórdão de julgamento que manteve inalterada a sentença condenatória prolatada em face do réu, pelas práticas de corrupção ativa e lavagem de dinheiro e que, no curso da Ação Penal, teve apreendidas armas de fogo de sua propriedade.

Para tanto, considerou-se que, em segunda instância, a sentença foi mantida por meio do uso indevido da técnica de argumentação per relationem, que se caracteriza pela repetição dos fundamentos anteriormente utilizados no processo, para cumprimento da exigência prevista pelo texto constitucional sobre a necessidade de motivação das decisões judiciais, nos termos do artigo 93, IX, da Carta Magna.

Muito mais do que uma mera formalidade, esse dispositivo constitui a garantia de que as decisões judiciais observarão o componente racional na valoração da prova, e a observância aos ritos assegurados pelo Código de Processo Penal, em detrimento do olhar subjetivo do julgador, sendo este um verdadeiro pilar da aplicação da justiça criminal no país.

Nesse sentido, embora a prática per relationem, por si só, não seja vedada em nosso ordenamento jurídico, por outro lado, revela-se imperioso que essa técnica sofra limitações pelos Tribunais brasileiros, a fim de que o intuito de promover a economia processual não resulte em verdadeira abstenção de análise pelas autoridades públicas nacionais, bem como na mecanização indevida do processo penal.

No caso concreto, a partir do atento olhar do Ministro Relator, o acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região fez uso ilegal da técnica per relationem, visto que sequer cuidou de acrescentar seus próprios fundamentos à decisão colegiada, em verdadeiro exercício de “copia e cola” dos fundamentos expostos no parecer assinado pela Procuradoria de Justiça. Sendo assim, a decisão do Superior Tribunal de Justiça é paradigmática por não ter admitido a aplicação irrestrita da técnica per relationem, a qual, no caso em análise, ofuscou a exigência de motivação do acórdão, em violação ao princípio da motivação das decisões judiciais.

 

Avelar Advogados na Mídia

  • Em matéria do Estadão, Beatriz Esteves comenta a intrincada questão jurídica que envolve a execução da pena de Robinho no Brasil. Leia a matéria completa.

  • Em matéria do Valor Econômico, Leonardo Avelar comenta decisão da Agência Nacional de Mineração que barrou uso de criptomoedas em pagamento de pedras e metais preciosos. Leia a matéria completa.

  • Avelar Advogados está entre os principais escritórios de Direito Penal Empresarial no ranking da Leaders League 2023.

 

Termômetro da Semana

Robinho e Daniel Alves: Discussões Sobre a Prisão de Brasileiros Por Supostos Crimes Cometidos em Outros Países

Cada vez mais casos de jogadores de futebol acusados de crimes sexuais ocupam espaço na mídia.

No âmbito legislativo, existe uma tendência dos países de modernização na legislação sobre investigações em crimes sexuais. A título exemplificativo, a legislação espanhola ganhou destaque com a promulgação da lei conhecida como “só sim é sim”, que entrou em vigor na Espanha em outubro de 2022, e amplia a abrangência do crime de violência sexual para considerar todos os atos não consensuais. Além disso, há o protocolo “No Callem”, criado em 2018 para combater agressões sexuais e violência de gênero em espaços de lazer, o qual define as medidas a serem adotadas em tais casos pelos locais de eventos.

Seguindo a mesma linha da legislação espanhol, aos 17 de fevereiro de 2023, foi publicada a Lei do Estado de São Paulo n.º 17.635/2023, que torna obrigatória a capacitação de funcionários de locais como bares, restaurantes e baladas para habilitá-los a “identificar e combater o assédio sexual e a cultura do estupro praticados contra a mulher que trabalha ou frequenta tais lugares”.

As inovações legislativas sobre crimes sexuais em espaços de lazer possuem relação com o contexto dos casos envolvendo os jogadores de futebol brasileiros Robinho e Daniel Alves.

O jogador Robinho, um dos principais jogadores do Milan à época dos fatos, teria participado de ato de violência sexual contra uma mulher, em conjunto com outros homens, em uma boate italiana no ano de 2013, sendo que foi condenado pela Justiça italiana à pena de 9 anos de prisão. Contudo, por ser brasileiro nato, o Governo da Itália ainda está tendo dificuldades para efetivar a prisão de Robinho no Brasil.

Com relação ao caso envolvendo Daniel Alves, o jogador foi acusado de ter estuprado uma jovem em uma boate espanhola no final de 2022, de modo que está preso desde 20 de janeiro de 2023, e seus pedidos de liberdade provisória foram negados pela Justiça espanhola.

Ao que parece, existe uma grande influência da dificuldade de prisão de Robinho na decisão de manutenção da prisão do jogador Daniel Alves. Isso porque, caso Daniel Alves conseguisse retornar ao Brasil, não poderia ser extraditado para a Espanha, por ser brasileiro nato, uma vez que a Constituição Federal veda a extradição de brasileiros natos.

No mesmo sentido, percebe-se uma maior pressão do Governo da Itália para evitar a percepção de impunidade do jogador Robinho. Nesse contexto, o Governo italiano apresentou recente requerimento ao Superior Tribunal de Justiça, a fim de solicitar o cumprimento da pena de Robinho no Brasil.

Ao contrário do que vem sendo aventado na mídia sobre a certeza da prisão de Robinho no Brasil, a viabilidade jurídica do pedido do governo italiano pode ser questionada. A principal controvérsia está relacionada ao fato de que, ainda que a Lei de Migração tenha previsão de transferência de execução de pena, a norma não se aplica aos brasileiros natos. Desta forma, apenas tratados internacionais específicos poderiam permitir a transferência de execução da pena, o que não ocorre no tratado de cooperação judiciária em matéria penal existente entre Brasil e Itália, uma vez que a cooperação entre os dois países não compreende a execução de condenações penais.

Por outro lado, percebe-se uma tendência política do atual governo favorável à possibilidade de transferência da execução da pena, conforme Nota Técnica do Ministério da Justiça. O próximo passo é a citação de Robinho para que apresente defesa no processo, que será julgado pelo Superior Tribunal de Justiça.

Não obstante a relevância e necessidade de correta punição dos crimes sexuais, é importante que as garantias constitucionais e processuais penais sejam respeitadas, a fim de se evitar nulidades e ilegalidades nos processos.



 

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