ODP News | 20.04.2023 | Edição n. 50
- Avelar Advogados
- 20 de abr. de 2023
- 8 min de leitura
Notícias, Jurisprudências, Projetos de Lei e o Termômetro da Semana.
News
TRF 3 Determina a Suspensão de Ação Penal que Investiga Práticas de Sonegação Fiscal Após o Réu Comprovar a Garantia do Tributo
Em recente decisão proferida no âmbito do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, o Desembargador Relator concedeu o pedido liminar do Habeas Corpus impetrado pela defesa técnica do Paciente, que é empresário no segmento de óleo e gás, para suspender o trâmite da Ação Penal em que ele se viu denunciado pela prática de sonegação fiscal, nos termos do artigo 1º, inciso I c.c artigo 12, inciso I, ambos da Lei Federal nº 8.137/1990.
Conforme consta da narrativa acusatória, o Paciente teria reduzido e suprimido tributos federais, a partir de declarações falsas prestadas às autoridades fazendárias acerca de valores devidos a título de PIS e Cofins, além de ter supostamente realizado operações de creditamento indevido, resultando na constituição de débito tributário no valor de R$ 4.905.951,92 (quatro milhões, novecentos e cinco mil, novecentos e cinquenta e um reais, e noventa e dois centavos).
Para tanto, o Desembargador Relator reconheceu a questão prejudicial atribuída ao aceite da garantia ofertada pelo Paciente, nos autos da Execução Fiscal correlata, consubstanciada na penhora de imóvel avaliado em R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais).
Nesse cenário, restaram duas alternativas para a dívida fiscal: ou a garantia será revertida ao Erário para pagamento do tributo - o que na seara criminal culminará na extinção da punibilidade do Paciente, nos termos do artigo 83, §4º, da Lei Federal nº 9.430/1996; ou o crédito tributário será desconstituído via Execução Fiscal, não havendo qualquer prejuízo a ser suportado pela Fazenda Pública.
Do ponto de vista técnico, para a concessão da liminar, reconheceu-se a presença de “fumus boni iuris uma vez que plausível solução que leve à suspensão da pretensão punitiva estatal e da prescrição, enquanto questão prejudicial de mérito (CPP, art. 93). O periculum in mora, por sua vez, é patente, pois a audiência, no processo-crime de origem, está agendada para junho de 2023, quando, possivelmente, dar-se-á o julgamento da ação penal, conforme prevê o Código de Processo Penal brasileiro (audiência una, de instrução e julgamento)”.
O entendimento exarado pelo Desembargador Relator representa a melhor aplicação dos crimes tributários, que possuem regramento específico, pois sempre haverá uma obrigação administrativa pré-existente a essas hipóteses delitivas.
Isso porque, como a criminalização do ilícito tributário – em evidente afronta ao princípio da intervenção mínima – possui caráter meramente utilitarista, no sentido de compelir o devedor ao pagamento do débito fiscal, como consequência, o pagamento integral do tributo satisfaz o objetivo do tipo penal, assim como reconhecido indiretamente na decisão que concedeu o pedido liminar do Habeas Corpus.
Portanto, autorizando a legislação pátria a reparação do dano, assim como comprovado pelo Paciente, outra alternativa não restava a não ser o acertado reconhecimento da questão prejudicial envolvendo a continuidade da Ação Penal.
Jurisprudência STJ
STJ Decide que a Propositura de Acordo de Não Persecução Penal Não Exige Confissão Prévia do Investigado
De acordo com o entendimento da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em julgamento que concedeu Habeas Corpus reconhecendo a nulidade do recebimento de uma denúncia feita pelo Ministério Público em face de um réu por crime previsto na Lei de Licitações, a propositura de acordo de não persecução penal (ANPP) não pode ser condicionada à confissão extrajudicial, em fase inquisitorial, uma vez que a falta de oferecimento tempestivo do acordo, desacompanhado de motivação idônea, resulta em nulidade absoluta.
No caso em questão, em síntese, o réu foi denunciado por contratação direta ilegal, de modo que não foi oferecida proposta de ANPP pelo Ministério Público. A defesa, então, arguiu a exigência de o Ministério Público expor as razões pelas quais rejeitou a propositura do ANPP, salientando a presença de todos os requisitos para o oferecimento do acordo.
O Parquet, por sua vez, alegou que os acusados, mesmo após terem acesso à íntegra da investigação e serem interrogados devidamente assistidos por advogados, não esboçaram qualquer pretensão de confessar os fatos. Mesmo assim, diante da notícia de que o acusado teria a pretensão de confessar a participação no delito em apuração, o Ministério Público requereu sua intimação para que informasse se possuía interesse em confessar formal e circunstancialmente os fatos praticados, a fim de que o Ministério Público pudesse agendar momento para formalização do ato e, na sequência, avaliar a pertinência da realização do acordo.
Por seu turno, a defesa suscitou que apenas cumpriria o mencionado requisito após conhecer e concordar com os termos do acordo. O Ministério Público relatou ter acatado o pedido e instaurado procedimento administrativo apresentando esses termos. No entanto, a defesa recusou as cláusulas previstas na proposta, alegando que na pretensão condenatória não havia certeza sobre a liquidação dos valores que teriam sido lesionados.
Nesse sentido, inconformada com o momento processual em que o acordo foi oferecido, 35 dias antes do fim do prazo prescricional da pena, a defesa impetrou Habeas Corpus no Superior Tribunal de Justiça onde, acertadamente, decidiram os Ministros da 6ª Turma que “por constituir um poder-dever do Parquet, o não oferecimento tempestivo do ANPP desacompanhado de motivação idônea constitui nulidade absoluta”.
Relatora da matéria, a ministra Laurita Vaz negou provimento ao Habeas Corpus. Em voto-vista, porém, o ministro Sebastião Reis Jr. abriu divergência, motivo pelo qual a ministra Laurita Vaz reconsiderou seus argumentos e votou com o ministro Sebastião Reis Jr., tendo sido acompanhada pelos ministros Rogerio Schietti Cruz e Antonio Saldanha Palheiro e pelo desembargador convocado Jesuíno Rissato.
Isso porque, o ANPP foi instituído com a finalidade de resguardar tanto o agente do delito, quanto o aparelho estatal, das desvantagens inerentes à instauração do processo-crime em casos desnecessários à devida reprovação e prevenção do delito.
Para isso, o legislador editou norma despenalizadora (28-A, caput, do Código de Processo Penal) que atribui ao Ministério Público o poder-dever de oferecer condições para o investigado não ser denunciado, caso atendidos os requisitos legais. Sendo assim, o benefício a ser eventualmente ofertado ao agente em hipótese na qual há justa causa para o oferecimento de denúncia, aplica-se ainda na fase pré-processual.
Nesse sentido, importante destacar que, ao exigir a existência de confissão formal e circunstanciada do crime, o artigo 28-A do Código de Processo Penal não impõe que tal ato ocorra necessariamente durante a fase da investigação criminal, sendo dever do Ministério Público oferecer o acordo nos casos em que for cabível, de forma tempestiva, e oportunizando ao investigado confessar a prática delitiva.
Dessa forma, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é um importante precedente para os casos em que o Ministério Público nega proposta de ANPP, sob o argumento de que não houve confissão, sendo essencial que o investigado possa refletir sobre o custo-benefício dos termos da proposta de ANPP oferecida, e tenha a oportunidade de confessar o delito em momento posterior à investigação criminal.
Jurisprudência STF
Supremo Tribunal Federal Entende Que Comparecimento da Vítima em Delegacia Não é Suficiente Para Representar Contra Acusado de Estelionato
Em recente decisão, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal entendeu que o comparecimento da vítima em Delegacia ou Juízo não é suficiente para extrair o seu interesse em oferecer representação criminal, a fim de que o acusado seja processado criminalmente. O julgamento teve origem no âmbito da Ação Penal nº 0061059-77.2016.8.26.0050, em que três pessoas foram denunciadas ao final de 2019 pela suposta prática de estelionato.
Ao longo do caso, dois dos três réus interpuseram Recurso Ordinário em Habeas Corpus, em face de acórdão do Superior Tribunal de Justiça, a fim de que fosse anulado o processo e intimada a vítima para que ofertasse representação criminal de maneira a prosseguir com a ação penal. Nesse sentido, o entendimento da Corte foi de parcial procedência do recurso, determinando que o Juízo de origem procedesse à intimação da vítima para manifestar eventual interesse em representar contra os acusados.
No que diz respeito ao tema em questão, ressalta-se que, até o advento da Lei Federal nº 13.964/2019 – também conhecida como Lei Anticrime –, o crime de estelionato era processado por meio de ação penal pública incondicionada. Contudo, tal reforma legislativa condicionou o processamento do crime em questão à representação da vítima contra o(s) acusado(s), isto é, tornou-se caso de ação penal pública condicionada à representação.
Ademais, há de se mencionar que se trata de inovação legislativa de caráter favorável ao réu, devendo, portanto, ser aplicativa de forma retroativa, nos termos do artigo 5º, XL, da Constituição Federal.
Dessa forma, foi acertado o entendimento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, ao entender que não é suficiente a vítima de estelionato apenas comparecer em Delegacia ou Juízo para configurar representação contra o(s) acusado(s), devendo ser exigida representação criminal formal da vítima, nos termos do artigo 171, §5º, do Código Penal.
Avelar Advogados na Mídia
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Termômetro da Semana
Inconstitucionalidade da Prisão Especial Para Portadores de Diploma Superior e a Proteção à Isonomia Entre os Indivíduos
No início do mês de abril, o Supremo Tribunal Federal finalizou julgamento que impactará de forma relevante o instituto da prisão provisória no país.
Isto porque, de forma unânime, o Tribunal entendeu por dar provimento a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 334, apresentada pela Procuradoria-Geral da República, que questionava a existência de prisão especial a portadores de diploma de ensino superior, quando em cumprimento de prisão provisória determinada pelo Poder Judiciário.
Em linhas gerais, discutia-se a constitucionalidade do artigo 295, VII, do Código de Processo Penal, que previa aos presos provisórios com formação no ensino superior o direito a cumprirem o cárcere em estabelecimento distinto dos demais, privilégio que o Ministério Público Federal entendia ferir a isonomia entre os indivíduos prevista na Constituição Federal de 1988.
De fato, a posição exarada pela Corte Suprema e pelo Procurador-Geral da República parece estar em consonância com os valores estabelecidos pela nossa Constituição, tendo em vista que, como analisado pelo relator da ação, o Ministro Alexandre de Moraes, o direito de ficar segregado dos demais presos somente deve persistir se houver uma motivação constitucional concreta que o justifique, tal qual se observa nos demais países que privilegiam um modelo de estado igualitário.
Nesse sentido, a utilização de referido instituto somente se justifica, para fins meramente exemplificativos, a figuras de estado e agentes das forças de segurança, em face dos riscos naturais envolvidos na manutenção destas pessoas no cárcere; ou a magistrados, advogados e outras figuras indispensáveis do Poder Judiciário, enquanto no exercício de seus respectivos misteres, para garantir o livre exercício de suas funções constitucionais.
Já no que toca especificamente aos portadores de diploma superior, não persiste qualquer fundamento concreto que justifique este privilégio, o que acarreta, por conseguinte, em tratamento diferenciado a um determinado grupo de indivíduos e uma violação ao princípio da igualdade, fundamento basilar de qualquer estado democrático.
Portanto, com exceção das figuras específicas já citadas anteriormente, não mais persistirá no país o direito a pessoas com diploma do ensino superior de cumprirem prisão preventiva em estabelecimento diverso dos demais indivíduos, o que parece ser o fim de um privilégio dado a pessoas, em regra, com maior poder aquisitivo e que, consequentemente, não possuía cabimento em um Estado Democrático de Direito.